... tudo ser e em cada flor florir

PALAVRAS COM ALMA

As imagens transbordam fugitivas

E estamos nus em frente às coisas vivas.

Que presença jamais pode cumprir

O impulso que há em nós, interminável,

De tudo ser e em cada flor florir?

Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)

Viagens de José Jorge Letria entre a realidade e a utopia

ANÁLISE LITERÁRIA - Infantil



Da colecção Sonhos a Cores, editada pela Ambar, eis dois títulos de José Jorge Letria: “António e o Principezinho” e “Os Animais Fantásticos”.
Originalmente publicado em 1993, "António e o Principezinho", foi reeditado em 2005. É uma história intemporal e para ser lida sem restrições de faixa etária.
José Jorge Letria presta homenagem a Antoine de Saint-Exupéry, o autor de "O Principezinho" – igualmente uma obra intemporal.
Saint-Exupéry surge – numa fusão de real e ficção – como o personagem António. Colocado no centro da criação literária de Letria, António interage com uma personagem por si inventada, o Principezinho. A realidade vai, progressivamente, cedendo terreno à imaginação e o leitor acaba por embarcar naquele sonho de menino/homem, numa viagem imaginária e eterna que contorna a morte ancorando em portos de lembranças.
Trata-se de um livro mágico, terno e sensível. Valoriza as palavras, a amizade e as relações humanas – bem em sintonia com o universo retratado por Saint-Exupéry. As ilustrações são de Teresa Lima, vencedora do Prémio Nacional de Ilustração em 1998.

"Os Animais Fantásticos" é um livro que dá a conhecer animais nascidos da imaginação humana: do basilisco ao unicórnio, passando pelo centauro, pelo ciclope, pela esfinge, pela fénix e pelo lobisomem, entre outros.
No total, o autor reconstitui, poeticamente, os contornos maravilhosos que ditam a "existência" de dezanove animais mágicos e que asseguram o seu lugar no imaginário das civilizações, nas mitologias, nos livros de contos e nas lendas tradicionais.
Às palavras de José Jorge Letria juntam-se as ilustrações de André Letria – mais um título que regista a união de talentos de pai e filho.
Poeta, jornalista, letrista, dramaturgo e ensaísta, José Jorge Letria foi distinguido com alguns dos mais importantes prémios literários portugueses (Associação Portuguesa de Escritores, Gulbenkian) e também com o Prémio Plural (México), o Prémio Internacional UNESCO, o Prix Internacional des Arts et des Lettres (Paris).
Na área da literatura infanto-juvenil (onde já publicou mais de três dezenas de títulos) destacam-se obras como "Versos de fazer ó-ó", "Portugal para os Pequeninos" e "Timor contado às Crianças... e aos outros".
Cada um dos livros aqui em destaque custa 12 euros.

Ubi Veritas

ALGUMA INSPIRAÇÃO

Quero aprender a ler nas estrelas
e decantar sua solene alquimia


Perscrutar o mimoso choro da aurora
de doces mistérios tecida


Matar a vida de desesperada quietude
e magoada introspecção


Cicatrizar as garras feridas
e descobrir onde jaz a palavra Amor


Salomé Castro in Ubi Veritas

Ficções roubadas à realidade mais profunda da vida

ANÁLISE LITERÁRIA - Contos
. Tem 224 páginas e custa 13,50 euros.

Rosa Lobato de Faria é uma exímia contadora de histórias. "Os Linhos da Avó" é disso exemplo. As palavras parecem brotar de uma fecundidade intensa mas transpirando casualidade. Logo se revelam aos sentidos, com elegância, sabiamente temperadas, de toque aveludado, perfume fresco e parecendo sussurrar intimidades roubadas à realidade.
O nome escolhido para intitular a obra - "Os Linhos da Avó" - de modo algum deixa adivinhar a riqueza, diversidade e deleite dos universos que percorrem o livro. São vinte e uma histórias que relatam/retratam o amor, a paixão, o desejo, o ciúme, a traição, o sobrenatural, a dedicação, a despedida, o segredo, a ambição, a solidão, a imaginação, a perda, o sonho, a desilusão, a dor... mas, mormente, a morte.
A morte é, sem dúvida, uma temática recorrente nesta obra. Ela fixa morada na grande maioria dos contos. Porém, não está ancorada em solo demasiado nostálgico; é apenas ponto de partida ou ponto de chegada (sobretudo) para ficções arrancadas "à realidade mais profunda da vida" - como se pode ler na contracapa do livro.
"Os Linhos da Avó" vinca também uma perspectiva feminina. As histórias falam quase sempre de mulheres, da sua essência, das suas fraquezas.
Rosa Lobato de Faria repete, nesta obra, o conto "Criada para Todo o Serviço" - já publicado em "Crimes de Mulheres" (colectânea de textos com assinatura de escritoras originárias do Chile, Portugal, México, Argentina, Uruguai e Peru) - onde dá a conhecer uma mulher fatalmente coerente com a sua natureza.
A capa do livro, da autoria de Afonso de Sousa, evoca, discretamente, algum do ambiente recrutado pelas palavras de Rosa Lobato de Faria. Embora com lugar à subjectividade, talvez uma referência ao Verão e Outono da vida, talvez uma alusão ao fruto alvo da tentação, com sua volúpia, plenitude e decorrentes tragédias.
"Os Linhos da Avô" integra a colecção Finisterra - Autores Contemporâneos de Língua Portuguesa, publicada pelas Edições ASA

O caminho para descobrir a normalidade na diferença

ANÁLISE LITERÁRIA - Infantil
Psicóloga Inês Borges Taveira ajuda a quebrar um silêncio cheio de perguntas

“Os meus pais estão separados, mas não de mim", da autoria da psicóloga Inês Borges Taveira, é um livro para ser lido por filhos e pais. Fala de receios, necessidades, emoções, mudança, culpa, partilha, dor, amor... família, sentimentos.
"Escrevi este livro a pensar nestes pais corajosos que, não obstante a tempestade de mudança e emoção que os envolve, querem construir com os filhos uma nova forma de estar em família", escreve a autora.
Se uma criança enxerga muito além do que tantas vezes se supõe é também certo que esbarra frequentemente em angústias – tanto mais profundas quanto presas a mudanças no seu mundo familiar.
A separação/divórcio dos pais, quando não devidamente clarificada pelo diálogo, pode gerar uma incompreensão que se manifesta em isolamento sofrido ou em extroversão que amplifica comportamentos não raras vezes agressivos.
"Espero que a história de Sebastião e da família o ajude a pensar na sua; como cada um sente e vive a separação e como cada um pode contribuir para a nova família", explica Inês Borges Taveira.
Além de contar uma história onde, com certeza, inúmeros pequenos e graúdos se revêem, este livro aponta caminhos – indicações validadas pela adequada formação da autora.
Inês Borges Taveira é psicóloga (University of Durham) e Master of Science em Psicologia Clínica (University of Surrey), com pós-graduações em Terapia Familiar (Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar) e Mediação Familiar (Asociación Interdisciplinaria Española de Estudios de la Familia). Desde 1995 que se especializou na área do divórcio/separação, desenvolvendo trabalho de assessoria aos tribunais de família e menores e leccionando nesta matéria.
"Os meus pais estão separados, mas não de mim" fornece pistas que ajudam a encontrar a normalidade na diferença. É igualmente uma proposta interessante para leitores que não estando enquadrados pela temática podem, ao conhecer a história do Sebastião e da família, compreender melhor uma experiência que toca outros com quem lidam: sejam primos, amigos, colegas, conhecidos...
Integrando a colecção "O Sol e a Lua", editada pela Campo das Letras, este livro (11,55 euros) conta com ilustrações de Fernanda Fragateiro, artista cujos projectos passam também pela escultura, instalação, intervenções em espaços públicos, e colaboração em projectos de arquitectura ou paisagismo.

Os versos que te fiz

PALAVRAS COM ALMA

Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer!

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz!

Amo-te tanto! E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

Florbela Espanca (1894-1930)

Estudo dos lugares e dos povos de todo o Mundo

ANÁLISE LITERÁRIA - Infantil, Didáctico



“A Minha Primeira Enciclopédia de Geografia” é uma introdução ao estudo dos lugares e dos povos de todo o Mundo. Catalogada para maiores de seis anos, esta obra constitui um excelente apoio para projectos escolares.
Nas sua páginas, cada continente tem o seu espaço próprio, incluindo mapas temáticos e políticos, informações e respectivas explicações e fotografias de qualidade que ilustram pormenores paisagísticos e aspectos do quotidiano.
“O fundo do oceano Pacífico está coberto de montanhas e vales chamados fossas. O lugar mais profundo da Terra é a Fossa das Marianas. Tem mais de 11 km de profundidade. Se atirasses uma pequena pedra para o mar, demoraria mais de uma hora a alcançar o fundo da Fossa das Marianas” - exemplo do tipo de informações prestadas pela enciclopédia.
Esta obra apresenta, também, uma introdução muito útil aos mapas e uma área destinada às bandeiras de todo o Mundo. Tem referência a mais de 40 sites e deixa sugestões de actividades que aí é possível desenvolver: explorar o Grand Canyon com a ajuda de um mapa onde se vai clicando; ouvir canções tradicionais dos habitantes dos Andes; passear pela floresta tropical e observar os animais do deserto do Sara; pesquisar uma selecção de fotografias e diapositivos de todo o Mundo…
Com chancela da Porto Editora
, a colecção “A Minha Primeira Enciclopédia” inclui outras áreas para além da Geografia: História, Ciência, Corpo Humano, Espaço, Oceanos e Mares, Animais e Mundo. O título aqui em destaque custa 14,90 euros.

Ubi Veritas

ALGUMA INSPIRAÇÃO
Lua de brincos de princesa
Fecundas meu presente
Me perfumas de vida
Me vestes de rainha

Roubei teu nome
Para brindar ao amor

Lua de pétalas vivazes
Beijas minha existência
Sopras suspiros de alma
Em meu peito aberto

Roubei teu nome
Para brindar ao amor

Lua de sedosa lanugem
Deitas-me sobre malmequeres
Poisados em dorso de tartaruga
E eu desmaio sem receio

Roubei teu nome
Para brindar ao amor

Meu alvo anjo
Minha doce
Lua

Salomé Castro in Ubi Veritas

Alfonsina y el mar

PALAVRAS COM ALMA

Por la blanda arena que lame el mar
su pequeña huella no vuelve más,
un sendero solo de pena y silencio llegó
hasta el agua profunda.
Un sendero solo de penas mudas llegó
hasta la espuma.

Sabe Dios que angustia te acompañó
qué dolores viejos calló tu voz
para recostarte arrullada en el canto
de las caracolas marinas.
La canción que canta en el fondo oscuro del mar
la caracola.

Te vas Alfonsina con tu soledad,
¿qué poemas nuevos fuiste a buscar?
Una voz antigua de viento y de sal
te requiebra el alma y la está llevando
y te vas hacia allá como en sueños,
dormida, Alfonsina, vestida de mar.

Cinco sirenitas te llevarán
por caminos de algas y de coral
y fosforescentes caballos marinos harán
una ronda a tu lado.
Y los habitantes del agua van a jugar
pronto a tu lado.

Bájame la lámpara un poco más,
déjame que duerma nodriza en paz
y si llama él no le digas que estoy
dile que Alfonsina no vuelve.
Y si llama él no le digas nunca que estoy,
di que me he ido.

O suicídio de Alfonsina Storni
(poetisa e escritora argentina, 1892-1938)
inspirou a canção "Alfonsina y el mar",
de Ariel Ramírez e Félix Luna.

Este tema foi já interpretado por inúmeros músicos,
nomeadamente pela prodigiosa fadista portuguesa
Cristina Branco (álbum Ulisses).

Era uma vez... animais que animam uma infinidade de histórias

ANÁLISE LITERÁRIA - Infantil


Os contos protagonizados por animais caracterizam-se por uma certa humanização dos mesmos. Eles pensam e agem como humanos e muitas vezes aparecem vestidos com roupas “de gente”.
Em “A ratita Tita”, a autora, Nadine Walter, fala de uma ratinha costureira. Este livro (Edições Nova Gaia) é o perfeito exemplo de uma história em que os animais surgem humanizados: comportam-se como pessoas (uns são trabalhadores, outros são inteligentes, outros vaidosos, outros preguiçosos…). A identificação dos leitores com as personagens sai, ainda, fortalecida pelo facto de os animais vestirem roupa. A moralidade que reveste a história passa para o entendimento da criança/leitor de forma discreta mas eficiente. “A ratita Tita” (7,98 euros) retrata as vantagens da entreajuda.
Também ressalvando a importância da entreajuda, do espírito de união e do respeito pelas diferenças, eis “A Pulga Salta-Pocinhas e os Grãos de Areia” (7,49 euros), de Margarida Damião Ferreira. Editado pela Presença, este é um livro com um enredo consistente, ideal para crianças que já apreciem a leitura.
Mas, se a pulga Salta-Pocinhas tem diariamente uma missão muito especial – a de ser mensageira dos grãos de areia –, também “Faísca, o agente especial” acredita que lhe está reservada uma grande missão. Este livro (8,40 euros), de Anabela de Saint-Maurice (Ambar), relata os pensamentos de um perdigueiro português e, através deles, aborda a temática da partilha e, até, dos afectos. Se é certo que a criança imagina que os animais também podem ter sentimentos como os seus, esta história não defrauda as suas expectativas.
Quanto mais novas são as crianças/leitores, menor deve ser o texto e mais valorizada deve ser a componente visual - por forma a remediar a dificuldade de concentração. “Faísca, o agente especial” atende a essa necessidade, porém, nesta obra as tradicionais ilustrações são substituídas por fotografias (de Gonçalo Rosa da Silva).
Os livros ilustrados dão à criança o prazer do jogo visual das formas e das cores. “A Galinha dos Ovos de Ouro” (1,74 euros), editado pela Papa-Letras, é exemplo dessa atenção privilegiada à cor. Da colecção “Mini Contos Clássicos”, este conto, reescrito por Margarida Braga, é um entre os muitos que ficam imortalizados na memória de gerações, pela força, curiosidade ou singularidade de protagonistas do reino animal.
Em “A baleia constipada e outras histórias”, de Marita Ferreira, (Campo das Letras, 7,98 euros) distintos animais – um galo, uma baleia, uma cegonha, um elefante, uma gata, uma jacaré... – surgem a par de alguns objectos animados – uns sapatos, uma nuvem, um bolo, um espantalho... indo, assim, ao encontro da curiosidade evidente dos mais novos no que diz respeito à natureza, aos animais e a tudo o que os rodeia; e despertando/alimentando também a sua criatividade.
No livro “A cabra-cabrita”, Flor Campino confere pensamento humano, sentimentos e linguagem, aos animais, como se estes fossem pessoas. Conta a aventura de uma cabrinha que anseia por liberdade e que, farta de estar fechada, se aventura na montanha. Na caminhada cruza-se com muitos outros animais – a borboleta, o coelho, o ouriço, a lagartixa, o esquilo, o melro, o cuco e o mocho – que a avisam dos perigos que a serra encerra. Mas, apesar da sua imprudência, pois menosprezou os perigos para que havia sido alertada, a história tem um final feliz. Um caçador aparece e resgata a cabrinha e, não obstante ter disparado a caçadeira, o lobo não morre, “desaparece na noite a uivar” – o que exemplifica a tendência para evitar o confronto do jovem leitor com a eventual morte do animal. A percepção de que é sábia a decisão de não descurar os conselhos dos mais experientes é a moral a retirar de “A cabra-cabrita” (8 euros), com chancela das Edições Afrontamento.
A personagem do lobo é, aliás, uma figura deveras requisitada para as histórias infantis.
E, se em histórias como “A ratita Tita” ele não é, afinal, tão mau quanto se possa pensar, normalmente o lobo encarna a figura de vilão, como acontece em “A cabra-cabrita” ou em “Um Lobo pela Trela” (11,90 euros), de Guido Visconti, editado pela Livros Horizonte. O agricultor Osvaldo tem uma tarefa complicada: levar à feira uma couve, uma ovelha que gosta de couves e um lobo que gosta de ovelhas. A missão, após alguns percalços, acaba por ser superada com êxito. Este livro tem a interessante particularidade de desafiar os leitores para a resolução de duas hipotéticas situações. Esta opção, para além de conseguir reter a atenção da criança, garante a sua simpatia por um livro que espera contar com a sua ajuda.

Ubi Veritas

ALGUMA INSPIRAÇÃO
Lírios abertos em arco-íris risonhos
Água corrente onde cintilam fios de cabelo dourado
Ei-la. Tão bela
Projecta riscas de azul turquesa
num céu de areia branca intocável
Vem vindo. Tão bela
Deves esconder teu dom, linda princesa
Mergulhar em teu doce encantamento
Vestir tua pele de fada
nascida das asas de um anjo
Voltar ao conto
onde bebias veneno celeste e vivias
Partiu. Tão bela
Não mais ousamos acreditar em ti
A inocência afogou-se em desertos de realidade vadia

Salomé Castro in Ubi Veritas

Como são horríveis a História, a Ciência, a Geografia e a Cultura

ANÁLISE LITERÁRIA - Juvenil
Aprender nem sempre é tarefa fácil. Os temas são muitas vezes aborrecidos, até mesmo horríveis. Foi certamente com base nesta teoria que nasceu a colecção "Horríveis" - dividida em quatro grandes áreas: História Horrível, Ciência Horrível, Geografia Horrível e Cultura Horrível.
Não se assustem, porém, os professores, pois esta colecção não desacredita nenhum dos temas. A missão é, precisamente, despertar a curiosidade do público juvenil para o quão interessantes podem ser as temáticas para as quais, à partida, se faz má cara ou se torce o nariz.
Ilustrados com casos práticos e jogos, os Horríveis arrecadam a simpatia de um vasto número de jovens, bem como a aprovação de inúmeros docentes, um pouco por todo o mundo – esta colecção está editada em mais de 30 países.
Em formato de livro de bolso (com aproximadamente 150 páginas), os Horríveis estão à venda por 8,90 euros, com chancela das Publicações Europa-América
.
Para cada uma das quatro grandes áreas, estão já editados vários títulos. Eis alguns:
HISTÓRIA HORRÍVEL
"A Terrível Segunda Guerra (Mundial)", com assinatura de Terry Deary e ilustrações de Martin Brown, desvenda os factos horrendos sobre a pior guerra de sempre. Fala das cidades ameaçadas pela neve e cercadas pelo inimigo, das trincheiras infestadas de mosquitos...
No domínio das curiosidades, revela, por exemplo, quais os soldados que, por serem tão fedorentos, os inimigos os encontraram devido ao seu mau cheiro; quem fez uma refeição de larvas ou, ainda, que bombas foram inventadas.
Lugar, também, para os rumores em que toda a gente acreditava, e para as armas mortíferas em que ninguém podia acreditar. Os leitores ficam, ainda, a saber que idosos de 80 anos se juntaram ao "Exército do Papá" e que miúdos de 12 defenderam Berlim até à sua inevitável derrota.
CIÊNCIA HORRÍVEL"Monstros Microscópicos" foi concebido por Nick Arnold e ilustrado por Tony de Saulles. Para aguçar a curiosidade dos jovens nada melhor do que algumas questões: Qual a criatura que põe ovos entre os nossos dedos dos pés? Quem são os bichos que vivem dos restos da nossa pele? Por que é que a nossa escova de dentes está coberta de germes? O que faz dos nossos intestinos o lar perfeito para as bactérias?
O mundo minúsculo dos micróbios desvenda-se, ainda, através do diário do ácaro do pó ou pela acção do investigador Dordebarriga - íntimo das bactérias.
GEOGRAFIA HORRÍVEL
O tumultuoso mundo dos "Rios Raivosos" é descrito por Anita Ganeri e ilustrado por Mike Phillips. De cascatas barulhentas, ao espantoso Grand Canyon - forjado por um velho rio -, passando por um breve contacto com piranhas esfomeadas ou com a excitante vida selvagem aquática... são algumas das propostas. Porém, há ainda a possibilidade de embarcar numa viagem com hidrólogos heróicos, desde um cume gelado até ao oceano.
CULTURA HORRÍVEL
Nick Arnold assina "Arqueologia Pavorosa". Clive Goddard ilustra. A proposta vai para os leitores que desejam tornar-se detectives do tempo e espreitar os tesouros que se escondem nos jardins, ou mesmo, que anseiem criar a sua própria múmia.
Contextualizando em termos temporais, o livro explora as primeiras incursões dos monstruosos caçadores de tesouros em busca de fortunas; depois, a actuação dos heróis que descobriram os segredos e as maldições dos túmulos perdidos; e, na actualidade, a acção dos computadores, que possibilitam a descoberta do passado, bem como a sua recriação
.

Ausência

PALAVRAS COM ALMA


Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.


Carlos Drummond de Andrade
(1902-1987)

Contos de Rubem Alves chamam as angústias pelos nomes

ANÁLISE LITERÁRIA - Infantil

"As Mais Belas Histórias de Rubem Alves" é uma selecção de oito dos mais apaixonantes contos do autor para a infância.
Plenas de alma, ternura e sabedoria, as histórias recriam um mundo maravilhoso onde a capacidade de sonhar afasta a cortina onde estão desenhados os medos e obstáculos que os mais pequenos enfrentam a cada novo desafio.
Nas palavras do próprio Rubem Alves, "as histórias têm o poder de transfigurar o quotidiano. Elas chamam as angústias pelos nomes e dizem o medo em canções. Com isto, angústias e medos ficam mais mansos".
Cada história encerra uma ponte entre adultos e crianças - feito apenas conseguido por grandes contadores. Problemas que atormentam os mais crescidos conseguem na literatura do brasileiro Rubem Alves um reflexo incrivelmente nítido. Separação, despedida, doença, morte, solidão... são temas dolorosos, de abordagem difícil, que só as metáforas ajudam a abordar, sem contornar.
"O mundo das crianças não é tão risonho quanto se pensa. Há medos confusos, difusos, as experiências das perdas, bichos, coisas, pessoas que vão e não voltam...", diz o autor - num dos vários textos de enquadramento que enriquecem esta obra.
Não obstante o uso de algumas expressões em português do Brasil, todo o discurso empregue pinta com simplicidade e inteligibilidade as peripécias dos vários heróis.
Nota máxima também para a imagem global do livro. Com fabulosas ilustrações de Aida Xavier, toda a obra ganha uma envolvência mágica. Traços com muita cor, beleza, ritmo e vitalidade, dão vida às histórias do mestre Rubem Alves.
"A menina e o pássaro encantado", "A árvore e a aranha", "A selva e o mar", "A montanha encantada dos gansos selvagens", "O medo da sementinha", "A operação de Lili", "A história dos três porquinhos" e "A volta do pássaro encantado" - são as oito apaixonantes histórias.
O livro integra a Colecção Fantasia das Edições ASA. Custa 13 euros.

Contador de histórias, filósofo, pedagogo, poeta, teólogo...
Rubem Alves nasceu em 1933, no Estado de Minas Gerais, no Brasil. Casou-se em 1959 e teve três filhos: Sérgio, Marcos e Raquel (a sua musa na escrita de contos infantis).
Na literatura e a poesia encontrou a alegria que o manteve vivo nas horas más por que passou. Assume-se admirador de Adélia Prado, Guimarães Rosa, Manoel de Barros, Octávio Paz, Saramago, Nietzsche, T. S. Eliot, Camus, Santo Agostinho, Borges e Fernando Pessoa, entre outros.
Afirma que é “psicanalista, embora heterodoxo”, pois acredita que no mais profundo do inconsciente mora a beleza. A sua obra, vasta e diversificada, resulta de uma actividade intensa em áreas tão distintas como a pedagogia, a poesia, a filosofia, o ensaio, a teologia, a literatura infantil e a psicanálise.
É um dos intelectuais mais famosos e respeitados do Brasil, com vários títulos já publicados na área das Ciências da Educação e da Literatura Infanto-Juvenil.

Ventos de desventura para uma balada de amor

ANÁLISE LITERÁRIA - Romance


"Balada de Amor ao Vento" foi o primeiro registo literário de Paulina Chiziane. Mais do que um romance, esta obra – publicada pela primeira vez em 1990 - é um acto de liberdade. Paulina Chiziane foi a primeira mulher moçambicana a escrever um romance e a ousar tecer considerações sobre o amor e suas afectações culturais.
Sarnau e Mwando são os protagonistas desta "Balada de Amor ao Vento". Uma longa caminhada onde a dor domina mas onde o amor teima em reacender a sua chama. Tendo como envolvente a tradição, os hábitos e os costumes do povo moçambicano, a história de encontros e desencontros do casal é apresentada com uma aura melodiosa e doce - não obstante todo o sofrimento presente – mas nunca demasiado melosa.
As cenas que o leitor visualiza são descritas através de metáforas; através de ricas representações simbólicas cuidadosamente encadeadas.
Na página 12 há uma frase que, se na altura nos faz parar e pensar, no fim do livro se revela como a sua supra-síntese: "O passado persegue-nos e vive connosco cada presente". Assim foi com Sarnau e Mwando.
"Balada de Amor ao Vento" é a história de um amor adiado pela força da fraqueza e da impotência. A fraqueza de um homem que busca uma felicidade quimérica, e a impotência (transmutada em força) de uma mulher perante o abandono: “Tu foste para mim vida, angústia, pesadelo. Cantei para ti baladas de amor ao vento. Eras para mim o mar e eu o teu sal. No abismo, não encontrei a tua mão”.
O livro integra a colecção Outras Margens da Editorial Caminho
e está à venda por 9,45 euros.

Ubi Veritas

ALGUMA INSPIRAÇÃO
Faixas negras desenham olhos rasgados
Certezas anciãs de remendados feitios
Não choro, não temo

Triângulos translúcidos são cidades
Proezas erguidas em telhados planos
Não choro, mas temo

Bandeiras intrépidas chamam por mim
Tristezas copulam com a esperança
E parem um choro que mata mas não dói

Salomé Castro in Ubi Veritas

Os gritos silenciosos e poéticos das submissas mulheres afegãs

ANÁLISE LITERÁRIA - Poesia

"A Voz Secreta das Mulheres Afegãs - O Suicídio e o Canto” de Sayd Bahodine Majrouh, é um livro impregnado de sentimentos fortes. Com notas, introdução e tradução, de Ana Hatherly, esta obra dá a conhecer melodias desconhecidas.
A situação repressiva vivida pela mulher na sociedade afegã aparece quase subjugada por uma empreendedora vontade de libertação – oculta mas de teor destemido.
São poemas breves e ritmados tecidos por mulheres que, de certa forma, arriscam a vida ao falar abertamente de amor, de honra, de morte – temas som sabor a sangue.
“Este volume, que traduzi a partir da edição francesa de 1993, é um libelo contra a repressão, seja ela onde for, seja ela contra quem for. Foi em nome desse espírito que empreendi esta tradução”, sustenta Ana Hatherly.
Servidão, repreensão, injúria, inferioridade, subordinação, humilhação, submissão, desigualdade... são noções demasiados impregnadas no quotidiano das mulheres afegãs, acolhidas com tristeza e vergonha desde o berço.
“No seu íntimo, a mulher pashtun se indigna, contesta, alimenta a sua revolta. Deste protesto escondido, dia após dia endurecido, ela revela dois testemunhos: o suicídio e o canto” - palavras de Sayd Bahodine Majrouh.
As provocações contidas nos “landays” (poemas curtos, de dois versos livres de nove e treze sílabas, sem rimas obrigatórias mas com sólidas escansões internas) são uma escapatória e uma manifestação de revolta aos desígnios do “macho” (pai, marido, filho - que as vitimizam).
Sayd Bahodine Majrouh (1928-1988), poeta e profundo conhecedor das formas de arte e de poesia do seu país, o Afeganistão, recolheu estes cantos que representam uma linguagem secreta feminina, que serve para expressar discursos de ódio, amor, erotismo e escárnio. Uma linguagem proferida à revelia, com revolta face aos homens e a uma cultura masculina dominante.
“A Voz Secreta das Mulheres Afegãs - O Suicídio e o Canto”, conta ainda com um posfácio de André Velter: “O Explorador da meia-noite”.
Publicado pela Cavalo de Ferro
, está à venda por 12,20 euros.

Ubi Veritas

ALGUMA INSPIRAÇÃO

Farol de luz trémula
Hospedas tuas asas
Em mastros hirtos
Que furam a imensidão

Candeeiros desalinhados
Disputam encantamentos
Na tez negra da noite
Que desfia novelos de algas

Infantistas esqueletos
Escutam teus gritos maternos
Ancorados em espias estrelas
E rumam para teu ninho

Em foz pincelada de prata
Desaguam tresmalhados neptunos
Choram e te saúdam
Farol de luz trémula



Salomé Castro in Ubi Veritas

... os sonhos do mundo

PALAVRAS COM ALMA
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim
todos os sonhos do mundo.


Fernando Pessoa (1988-1935)